Taxas de infecção de HIV, sífilis, hepatites (B e C) e tuberculose; conhecimento, atitudes e práticas relacionadas às infecções sexualmente transmissíveis e cultura de uso de crack e outras drogas entre usuários de Pernambuco.

Edital/Chamamento: 
Chamamento Público nº 20/2013
Número do Projeto: 
TC 273/2013

Pesquisador(es)

Pesquisador(es) Responsável(eis): 
Ana Maria de Brito

Instituição

Instituição: 
Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães (CPqAM); Fundação Oswaldo Cruz/Pernambuco.
Endereço: 
Av. Professor Moraes Rego, s./nº, Cidade Universitária, Campus da UFPE, Recife, PE, Brasil.
Parcerias institucionais: 
Programa ATITUDE da Secretaria Executiva de Políticas Sobre Drogas - Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude de Pernambuco; Programa Estadual de Controle de DST/Aids e Programa Estadual de Controle da Tuberculose da Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco; Laboratório Central de Saúde Pública de Pernambuco (LACEN/PE) da Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco; Secretaria Municipal de Saúde do Cabo de Santo Agostinho/PE; Secretaria Municipal de Saúde de Caruaru/PE; Secretaria Executiva de Promoção da Saúde de Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Mobilização Social de Jaboatão dos Guararapes/PE; Secretaria Municipal de Saúde da Prefeitura da Cidade do Recife/PE; Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID); Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).
Período de Vigência: 
2013-2015
Situação: 
Concluída

Introdução e Justificativa

O crack tornou-se uma preocupação nacional em decorrência do avanço de consumo nos últimos anos, de seu impacto na vida dos usuários, familiares e comunidade, tornando-se grande desafio para a saúde pública.

Objetivos

Em decorrência da diversidade social e cultural do País, faz-se necessário conhecer os contextos locais para melhor enfrentamento do problema. Este estudo teve como objetivo conhecer o perfil dos usuários e a cultura de uso de crack, assim como as taxas de infecção pelo HIV, sífilis e hepatites virais dos usuários de crack, em Pernambuco.

Materiais e Método

Estudo de corte-transversal, com amostra dos usuários de crack, por sexo, atendidos pelo Programa ATITUDE nos municípios do Recife, Jaboatão, Cabo e Caruaru, maiores de 18 anos, que usavam regularmente crack por qualquer via, e realizaram testes rápidos para detecção de HIV, sífilis e hepatites B e C.

Resultados - Parciais ou Finais

Dos 1.062 entrevistados, 819 eram homens (77,1%), entre 18 e 34 anos (59,1%), negros (65, % pardos e 15,5% pretos). A análise por sexo mostrou diferenças significativas de muitas características: as mulheres são mais jovens (média = 27,3 anos), homens (média = 29,7 anos); têm menor escolaridade (13,6% ingressaram no Ensino Médio versus 21,6%, homens); maior proporção morava com companheiro (29,6% contra 16,8%); tiveram mais filhos (84,0% contra 58%). Entre as que têm filhos, 19% moram com eles (homens, 4%); maior envolvimento em trabalho sexual como fonte de renda (21,4% contra 2,4%), e na troca de sexo por dinheiro para comprar drogas (19,8% e 4,2%). Quanto ao consumo de crack, as mulheres iniciam o consumo mais jovens (26,7% antes dos 15 anos, e os homens, 15%); utilizam mais o crack apenas em cachimbos (26,3%), sem misturar a outras drogas, do que os homens (17,8%); e consumiam mais pedras por dia (27 versus 24); 45% das mulheres referiram ter trocado sexo por crack, contra 8% dos homens, que têm maior participação no tráfico em troca de crack. Cerca de 42% referiram mais de 10 parceiros sexuais no último ano; somente 24,6% usaram preservativo em todas relações. A quase totalidade (96,3%) sofreu algum tipo de violência: psicológica (83,6%), e/ou violência física (77,7%); 58,4% foram feridos com arma branca/fogo. As mulheres sofreram cinco vezes mais violência sexual (54,3% versus 10,6%). A prevalência da infecção HIV foi de 6,9% (IC95% 5,5-8,4), 17 vezes mais do que a estimada para a população brasileira (0,4%); a de sífilis, de 29,8% (27,2-32,8). Em relação à hepatite B, foi 4,3% (3,2-5,6), e a de hepatite C, 1,6% (0,9-2,4).
Conclusões: 
Uma expressiva parcela de usuários de crack em Pernambuco vive em situação de rua, envolvidos com atividades ilícitas e/ou comercialização do sexo, em contexto de elevada vulnerabilidade individual, com maior exposição, tanto a situações de violência, como de riscos para infecção pelo HIV e outras IST, que se refletem nas prevalências obtidas de sífilis, hepatite B, hepatite C e HIV, superiores às estimadas para a população brasileira. Os dados também apontam para a necessidade de estratégias de prevenção e controle das IST que considerem a perspectiva das desigualdades de sexo.
Palavras-Chave: 
Usuários de drogas. Cocaína. Crack. Soroprevalência de HIV. Sorodiagnóstico da sífilis. Hepatite B. Hepatite C.

Divulgação e/ou Publicações

ALMEIDA, R. B. F. et al. Tratamento da dependência na perspectiva das pessoas que fazem uso de crack. INTERFACE - Comunicação, Saúde, Educação, v. 22, n. 66, p. 745-56, 2018.

SANTOS, Naíde Teodósio Valois; ALMEIDA, Renata Barreto Fernandes de; BRITO, Ana Maria de. Vulnerabilidade de usuários de crack ao HIV e outras doenças transmissíveis: estudo sociocomportamental e de prevalência no estado de Pernambuco. In: CADERNO DE APRESENTAÇÃO DE DADOS PRINCIPAIS (Pesquisa) - Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães, Fundação Oswaldo Cruz, [s.n.], 2016.

11º CONGRESSO BRASILEIRO DE SAÚDE COLETIVA – ABRASCO, Goiânia, ago./2015. Crack virado: análise do uso em um Programa de Proteção Social Especial – Programa Atitude do Estado de Pernambuco, Brasil (Resultados Preliminares). (Apresentação/Comunicação).

11º CONGRESSO BRASILEIRO DE SAÚDE COLETIVA – ABRASCO, Goiânia, ago./2015. Mudanças no padrão de consumo de crack após ingresso em Programa de Proteção Social Especial – Programa Atitude do Estado de Pernambuco, Brasil (Resultados Preliminares). (Apresentação/Comunicação).

CENTRO DE PESQUISAS AGGEU MAGALHÃES, Fundação Oswaldo Cruz, Recife; Departamento de Medicina Preventiva, Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo; Instituto de Medicina Tropical, Universidade de São Paulo (Apresentação/Comunicação).

CONGRESSO INTERNACIONAL DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA MULTIDISCIPLINAR DE ESTUDOS SOBRE DROGAS, Brasília, dez./2015. Avaliação dos usuários acerca de mudanças no padrão de consumo de crack após ingresso em Programa de Proteção Social Especial – Programa ATITUDE do Estado de Pernambuco. (Apresentação/Comunicação).

DEPARTAMENTO de Medicina Preventiva, Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo; Departamento de Saúde Coletiva, Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães, Fundação Oswaldo Cruz, Pernambuco HPV in Rio 2016, Rio de Janeiro, Jul./2016. Antecedentes de DST e acesso a tratamento entre usuárias de crack de um estado do Nordeste brasileiro. [Certificado Melhor Trabalho Pôster].

HPV in Rio 2016, Rio de Janeiro, jul./2016: Antecedentes de DST e acesso a serviços de saúde para tratamento entre usuários de crack do estado de Pernambuco. (Pôster).

Realização de Seminário “Vulnerabilidade de usuários de crack ao HIV e outras doenças transmissíveis: estudo sociocomportamental e de prevalência no Estado de Pernambuco”, Recife, abril/2016.

V CONGRESSO INTERNACIONAL SOBRE DROGAS e o II SEMINÁRIO DE PESQUISA E EXTENSÃO EM ÁLCOOL E DROGAS, São João Del Rey, MG, nov./2015. Formas de consumo de crack entre usuários de Pernambuco. (Apresentação/Comunicação).

X CONGRESSO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE DST e VI CONGRESSO BRASILEIRO DE AIDS, SP: maio/2015. Prevalência de HIV e fatores associados em usuários de crack atendidos em um programa de proteção social especial – Programa ATITUDE do Estado de Pernambuco, Brasil (resultados preliminares). (Apresentação/Comunicação).

X CONGRESSO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE DST e VI CONGRESSO BRASILEIRO DE AIDS, SP: maio/2015. Sífilis em usuários de crack: estudo de prevalência em um programa de proteção social especial – Programa ATITUDE do Estado de Pernambuco, Brasil (resultados preliminares); (Apresentação/Comunicação).

ALMEIDA, Renata Barreto de. Caminho das pedras: cultura do uso de crack em Pernambuco. 2017. Tese (Doutorado em Saúde Coletiva) – Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, 2017.

JACQUES, Iracema de Jesus Almeida Alves. Relações sexuais desprotegidas entre usuários de crack no estado de Pernambuco. 2016. Dissertação (Mestrado Programa em Saúde Pública) – Fundação Oswaldo Cruz, Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães, Recife, 2016.

SANTOS, Daianny de Paula. Situações de violência entre mulheres usuários de crack no Estado de Pernambuco. 2016. Monografia (Programa de Residência Multiprofissional em Saúde Coletiva) – Fundação Oswaldo Cruz, Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães, Recife, 2016.

SANTOS, Daianny de Paula. Fatores associados à violência de gênero e uso de drogas: um estudo sobre vulnerabilidade entre usuárias de crack no Estado de Pernambuco. Fundação Oswaldo Cruz, Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães, Recife. [Em curso].

Aplicabilidade para o SUS

Os achados obtidos nesta pesquisa revelam questões importantes a serem consideradas para maior cobertura e efetividade das ações de prevenção e assistência à saúde da população de usuários de crack em Pernambuco, entre os quais: foi observado um consumo de múltiplas drogas entre os usuários pesquisados, sendo elevado o consumo de álcool, tabaco, maconha, inalantes e cocaína. É importante ressaltar a redução de quase três vezes do consumo médio de pedras de crack após acessarem o Programa ATITUDE, além das mudanças positivas no padrão de uso. No que se refere ao uso de alguma outra droga para substituir ou diminuir os efeitos negativos do crack, quase metade dos usuários referiram usar a maconha com esse objetivo. Já em relação ao álcool, os usuários referiam usar tanto para aumentar o efeito do crack como para diminuir a fissura ou “nóia”. Assim como em pesquisas realizadas desde 2009 com a população usuária de crack no Recife, foi verificada forma peculiar de consumo da droga na região – o uso do virado. Esta droga é feita a partir da maceração do crack e da adição de ácido bórico, formando o borato de cocaína, que depois de seu aquecimento e raspagem após esfriamento, transforma-se num pó que é cheirado. Essa forma de uso traz consigo novas formas de exposição a infecções decorrentes do consumo de crack, associadas a lesões causadas na mucosa nasal, além do compartilhamento de canudos. O acesso a serviços da saúde e assistência social foi outro aspecto abordado, e verificou-se ainda baixo acesso a serviços da assistência social, além do Programa ATITUDE. Contudo, o percentual de acesso a CAPS e outros serviços de saúde foi mais elevado do que o observado no perfil nacional dos usuários de crack, o que pode estar relacionado aos encaminhamentos e articulação do Programa com a rede de saúde, apesar do acesso aos serviços de urgência e emergência ser maior que aos postos ou centros de saúde. Em relação a situações de maior vulnerabilidade para a infecção pelo HIV, sífilis e hepatites, observou-se que a maioria dos usuários compartilha cachimbos e canudos, além de já terem feito tatuagens e colocado piercings. A troca de sexo também se faz presente como uma alternativa para conseguir o crack sem dinheiro. Por outro lado, os usuários são referenciados pelo Programa ATITUDE para os Centro de Testagem e Aconselhamento do SUS (CTA), o que reflete no percentual observado de cobertura para testagem do HIV, mais elevado do que o verificado para a população geral e nos demais estudos realizados com esse subgrupo populacional. As prevalências de HIV e sífilis foram acima das observadas para a população geral, como verificado no perfil nacional dos usuários de crack. Contudo, a prevalência de tuberculose verificada foi a metade da observada no perfil nacional, podendo estar relacionada ao encaminhamento dos sintomáticos pelo ATITUDE para a rede de saúde para diagnóstico e tratamento. A prevalência de violência sofrida pelos usuários de crack nos mostra uma população extremamente vulnerabilizada, assim como o quantitativo que já foram presos ou detidos, especialmente por assalto e roubo, meios que utilizam para conseguir a droga, mas também por tráfico, uso e posse de drogas. As mulheres, mesmo em menor número, precisam de um olhar diferenciado, observando as peculiaridades em seu perfil. Apresentam elevada prevalência de troca de sexo por droga, de violência sexual e de sífilis e HIV, bem acima do observado para os homens. Quanto ao Programa ATITUDE, ação governamental no campo da proteção social, com base nas diretrizes do SUAS (Sistema Único de Assistência Social), convivência comunitária, redução de danos e exercício da cidadania, os achados nos mostram que pode ser uma importante estratégia na constituição de redes de cuidado para usuários de crack e de outras drogas, incluindo o controle de doenças infecciosas mais prevalentes nessa população.